12.3.13

Leve




Esse leão que ronda as águas... 
O que procura?


Lí que Tisbe¹ estava à espera

quando a fera apareceu
Ficou um medo

à esconder-se sob a árvore.
Ví que, no jardim, as amoras surgiam
Imaginei que Píramo nunca chegaria.

Ficou um lenço manchado sob a árvore.

Já não lembrava dos "sonhos adormecidos"
ou, talvez por isso, tenha enfrentado o leão
Ah, que doce delícia,

o fruto do desejo saciado!
De leão à tenro felino...

Ficou um poema nos lençóis sobre a cama.

Quero é que o leão me leve

e me devore bem de leve.

E não restou espaço para saudades.


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¹O conto de Píramo e Tisbe, faz parte da Mitologia Grega e pode ser considerado como a principal influência que o dramaturgo inglês, William Shakespeare, teve para elaborar sua mais famosa obra: Romeu e Julieta.

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O mito d'A Árvore do Amor ou De como as amoras ficaram vermelhas


Píramo e Tisbe

"Píramo era o mais belo jovem e Tisbe, a mais formosa donzela em toda a Babilônia, onde Semíramis reinava. Seus pais moravam em casas contíguas; a vizinhança aproximou os dois jovens e o conhecimento transformou-se em amor. Seriam venturosos se se casassem, mas seus pais proibiram. Uma coisa, contudo, não podiam proibir: que o amor crescesse com o mesmo ardor no coração dos dois jovens. Conversavam por sinais ou por meio de olhares, e o fogo se tornava mais intenso, por ser oculto.

Na parede que separava as duas casas, havia uma fenda provocada por algum defeito de construção. Ninguém a havia notado antes, mas os amantes a descobriram. Que há que o amor não descubra? A fenda permitia a passagem da voz; e ternas mensagens passaram nas duas direções, através da fenda. Quando Píramo e Tisbe se punham de pé, cada um de seu lado, suas respirações se confundiam.

- Parede cruel! - exclamavam. - Por que manténs separados dois amantes? Mas não seremos ingratos. Devemos-te, confessamos, o privilégio de dirigir palavras de amor a ouvidos complacentes. 

Diziam tais palavras, cada um de seu lado da parede; e, quando a noite chegava e tinham de dizer adeus, apertavam o lábio contra a parede, ela do seu lado, ele do outro, já que não podiam aproximar-se mais.

De manhã, quando a aurora expulsara as estrelas e o sol derretera o granizo nas ervas, os dois encontraram-se no lugar de costume. E então, depois de lamentarem seu cruel destino, combinaram que, na noite seguinte, quando tudo estivesse quieto, eles se furtariam aos olhares vigilantes, deixariam suas moradas, dirigir-se-iam ao campo e, para um encontro, iriam ter a um conhecido monumento que ficava fora dos limites da cidade, chamado o Túmulo de Nino, e combinaram que aquele que chegasse primeiro esperaria o outro, junto de uma certa árvore.Era uma amoreira branca, próxima de uma fonte. Tudo ficou combinado e os dois aguardaram, impacientes, que o sol se escondesse sob a s águas e que a noite delas se levantasse. Então, Tisbe ergueu-se, cautelosamente, sem ser observada pela família, cobriu a cabeça com um véu, caminhou até o monumento e sentou-se embaixo da árvore. Enquanto estava ali sentada, sozinha, à luz difusa da noite, avistou uma leoa, que, com a boca ensangüentada por uma presa recente, aproximava-se da fonte, para matar a sede. Ao vê-la, Tisbe fugiu e refugiou-se numa gruta, deixando cair o véu quando fugia. A leoa, depois de saciar a sede na fonte, virou-se para voltar aos bosques, e, ao ver o véu no chão, investiu contra ele e despedaçou-o, com sua boca ensangüentada. 

Píramo, que se atrasara, aproximou-se, então, do local do encontro. Viu, na areia, as pegadas da leoa e o sangue fugiu-lhe das faces. Logo em seguida, encontrou o véu, dilacerado e cheio de sangue. 

- Desventurada donzela! - exclamou. - Fui a causa de tua morte! Tu, mais digna de viver que eu, caíste como primeira vítima. Seguir-te-ei. Fui o culpado, atraindo-te a um lugar tão perigoso, e não estando ali eu próprio a guardar-te. Vinde, leões, dos rochedos e despedaçai com vossos dentes este corpo maldito!

Apanhou o véu, levou-o até a árvore onde fora combinado o encontro, e cobriu-o de beijos e lágrimas.

- Meu sangue também manchará teu tecido - exclamou.

E arrancando a espada mergulhou-a no coração. O sangue esguichou da ferida, tingiu de vermelho as amoras brancas da árvore, e, penetrando na terra, atingiu as raízes, de modo que a cor vermelha subiu, através do tronco, até o fruto. 

Enquanto isso, Tisbe, ainda trêmula de medo, e não desejando, contudo, desapontar o amante, saiu cautelosamente, procurando o jovem com aflição, ansiosa por contar-lhe o perigo que atravessara. Ao chegar ao local e vendo a nova cor das amoras, duvidou que estivesse no mesmo lugar. Enquanto hesitava, avistou um vulto que se debatia nas vascas da agonia. Recuou, e um tremor percorreu-lhe o corpo todo, como a água tranqüila se encrespa ao ser atingida por uma lufada repentina de vento. Logo, porém, reconheceu o amante, gritou e bateu no peito, abraçando-se ao corpo sem vida, derramando lágrimas sobre as feridas e beijando os lábios frios.

- Píramo, quem te fez isto? - exclamou. - Responde, Píramo! É tua Tisbe quem fala. Sou eu, a tua Tisbe, quem fala. Ouve-me, meu amor, e ergue esta cabeça pendente!

Ao ouvir o nome de Tisbe, Píramo abriu os olhos e fechou-os de novo. A donzela avsitou o véu ensangüentado e a bainha vazia da espada.

- Tua própria mão te matou e por minha causa - disse. - Também posso ser corajosa uma vez, e meu amor é tão forte quando o teu. Seguir-te-ei na morte, pois dela fui a causa; e a morte, que era a única que nos podia separar, não me impedirá de juntar-me a ti. E vós, infelizes pais de nós ambos, não negueis nossas súplicas conjuntas. Como o amor e a morte nos juntaram, deixai que um único túmulo nos guarde. E tu, árvore, conserva as marcas de nossa morte. Que tuas frutas sirvam como memória de nosso sangue. 

Assim dizendo, mergulhou a espada no peito. 

Os pais ratificaram seu desejo, e também os deuses. Os dois corpos foram enterrados na mesma sepultura, e a árvore passou a dar frutos vermelhos, como faz até hoje. 

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Algumas citações ao mito de Píramo e Tisbe, na literatura:


Moore, na "Batalha da Sílfide", referindo-se à lâmpada de segurança de Davy, relembra a parede que separava Tisbe de seu amante. 

Bendita a gaze de metal tão fina 
Seguro protetor; 
Com que Davy rodeia, e que domina 
O fogo destruidor. 
Através da parede, a todo o instante, 
Podem a Chama e o Ar, 
como podiam Tisbe e seu amante, 
Se ver, mas não beijar. 

Camões, nos Lusíadas, faz a seguinte alusão indireta ao episódio de Píramo e Tisbe e à metamorfose das amoras, quando descreve a Ilha dos Amores: 


Os dons que dá Pomona, ali natura 
Produz diferentes nos sabores, 
Sem ter necessidade de cultura, 
Que sem ela se dão muito melhores; 
As cerejas purpúreas na pintura; 
As amoras, que o nome têm de amores; 
O pomo, que da pátria Pérsia veio, 
Melhor tornado no terreno alheio. 

Se o leitor tem tão pouco coração que se disponha a dar algumas gargalhadas à custa dos desventurados Píramo e Tisbe, terá oportunidade de fazê-lo recorrendo à uma das melhores comédias de Shakespeare: Sonho de Uma Noite de Verão, onde o episódio é apresentado de forma divertida." 

trecho extraído da obra "O Livro de Ouro da Mitologia" de Thomas Bulfinch, Ediouro, 2000. 

[adaptado por MOACIR ÍNDIO DA COSTA JÚNIOR, POA,RS, 03 de setembro de 2002] [PMXIX]





Um comentário:

  1. Que lindo poema, Priscilla. Amei a linguagem que usas. Mas, amei mesmo o seu carinho. Muito obrigado por sua amável atenção. Fico emocioando e lisonjeado com tamanho cuidado. Tê-la não só como seguidora do espaço, Sapere Aude, e,também, como amiga e por demais gratificante para mim. Esteive ausente. Motivos acadêmicos,trabalho etc. Espero poder um dia retruir isso com igual ou maior intensidade. Um abraço minha querida Amiga... Fica na Paz...

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